Quando assisti a "Ipanema Adeus" imediatamente lembrei de "Fim de Festa" (1978). Último dos três filmes dirigidos pelo ator e produtor Paulo Porto na década de 70, "Fim de Festa" reacendia a velha questão angústia e fuga, em uma versão low-profile: o rico e angustiado Marcelo (Paulo Porto), em vez de se embrenhar pelos interiores do país, faz uma parada rápida em Angra dos Reis e tira uns dias de folga da vida estressante de executivo.
Baseado em história do famoso dramaturgo Péricles Leal e roteirizado pelo não menos famoso Gilberto Braga, "Fim de Festa" permite refletir sobre como nos anos 70 era possível gastar dinheiro, mobilizar equipe e elenco excepcionais por um fio de argumento, construído a partir de uma simples observação do cotidiano.
Prólogo de Altman (A guerra entre os homens e as mulheres/ É esse o grande assunto/ Mais importante/ do que raça/ ou/ religião), e algumas sequências do casal Marcelo e Márcia (Maria Fernanda, filha da poetisa Cecília Meirelles), bastam para que o espectador entenda que Márcia escraviza Marcelo através do poder financeiro. Herdeira de uma grande empresa, colocou lá o marido como chefe. Paulo Porto, àquela altura já um homem de sessenta anos, faz o papel típico dos quarentões cariocas setentistas, fumando cigarros Charm e freqüentando festas de arromba no Alto Leblon.
O Rio de fins dos anos 70, da Boate Hippopotamus, da cocaína endêmica e afins, ressurge vivo e fagueiro. Mas logo Marcelo voa de carro cidade adentro, passando por ruas da Barra da Tijuca onde naquele tempo só havia motéis -- inclusive o pioneiro, Playboy Motel -- e sem avisar nem ao periquito de estimação, dirige rumo ao sul fluminense. Na entrada de Angra, o pneu fura, e é auxiliado por Lena (Zaíra Zambelli), com quem inicia conversa irritante. Depois de se estabelecer em um hotel no centro da cidade, volta a esbarrar com Lena, pintando um quadro na beira da praia.
A moça vive em um barco nas proximidades, junto com a amiga Tânia (Denise Bandeira), ambas artistas plásticas naquele estilo de organização que faz os vizinhos se perguntarem: "Como sobrevivem?". Desfrutando com um e outro, Tânia e Lena nunca realizam o que há de mais simples: admitir que, no fundo, ficariam melhor entre si. Aos poucos, a história deixa claro que é isso o que deseja Tânia, mas Lena apaixona-se pelo velho lobo Marcelo, e um triângulo tenso os consome.
Paulo Porto saiu-se muito bem na interação com Zambelli, quase natural, inclusive nas cenas de sexo. Passando a viver entre o barco Gaivota e uma casa que Marcelo transa, Lena o carrega para a idília dos desbundados balneários, participando de uma festa em que a enciumada Tânia faz strip-tease, antes de propôr ménage ao casal de pombinhos. Novamente aqui, o renitente vício do cinema brasileiro em associar o lesbianismo -- Tânia é a única que se assume -- a certa degradação moral e existencial.
Curioso vermos surgir do nada um grupo de terapia corporal, nos moldes reichianos, bailando em volta de Lena-Marcelo. A menina se empolga, dá alguns passos, e fala sobre estudos que comprovam a cura através da dança. O que pouca gente percebe é que no meio do grupo está a atriz Débora Bloch, então com 15 anos de idade, fazendo sua estréia no cinema.
O reaparecimento da mulher de Marcelo e o desfecho trágico respondem à pergunta óbvia: como um filme sobre tão pouco termina? Por sua falta de horizontes, "Fim de Festa" nos deixa a importante lição de que arte -- mesmo em um país subdesenvolvido -- pode ser apenas um exercício de contemplação. De se lamentar somente que Paulo Porto sobreviveu ainda vinte anos e nunca mais dirigiu, sendo este e o inesquecível "Em Família", exercícios de formalismo talentoso, que fariam diferença nas décadas seguintes.
Baseado em história do famoso dramaturgo Péricles Leal e roteirizado pelo não menos famoso Gilberto Braga, "Fim de Festa" permite refletir sobre como nos anos 70 era possível gastar dinheiro, mobilizar equipe e elenco excepcionais por um fio de argumento, construído a partir de uma simples observação do cotidiano.
Prólogo de Altman (A guerra entre os homens e as mulheres/ É esse o grande assunto/ Mais importante/ do que raça/ ou/ religião), e algumas sequências do casal Marcelo e Márcia (Maria Fernanda, filha da poetisa Cecília Meirelles), bastam para que o espectador entenda que Márcia escraviza Marcelo através do poder financeiro. Herdeira de uma grande empresa, colocou lá o marido como chefe. Paulo Porto, àquela altura já um homem de sessenta anos, faz o papel típico dos quarentões cariocas setentistas, fumando cigarros Charm e freqüentando festas de arromba no Alto Leblon.
O Rio de fins dos anos 70, da Boate Hippopotamus, da cocaína endêmica e afins, ressurge vivo e fagueiro. Mas logo Marcelo voa de carro cidade adentro, passando por ruas da Barra da Tijuca onde naquele tempo só havia motéis -- inclusive o pioneiro, Playboy Motel -- e sem avisar nem ao periquito de estimação, dirige rumo ao sul fluminense. Na entrada de Angra, o pneu fura, e é auxiliado por Lena (Zaíra Zambelli), com quem inicia conversa irritante. Depois de se estabelecer em um hotel no centro da cidade, volta a esbarrar com Lena, pintando um quadro na beira da praia.
A moça vive em um barco nas proximidades, junto com a amiga Tânia (Denise Bandeira), ambas artistas plásticas naquele estilo de organização que faz os vizinhos se perguntarem: "Como sobrevivem?". Desfrutando com um e outro, Tânia e Lena nunca realizam o que há de mais simples: admitir que, no fundo, ficariam melhor entre si. Aos poucos, a história deixa claro que é isso o que deseja Tânia, mas Lena apaixona-se pelo velho lobo Marcelo, e um triângulo tenso os consome.
Paulo Porto saiu-se muito bem na interação com Zambelli, quase natural, inclusive nas cenas de sexo. Passando a viver entre o barco Gaivota e uma casa que Marcelo transa, Lena o carrega para a idília dos desbundados balneários, participando de uma festa em que a enciumada Tânia faz strip-tease, antes de propôr ménage ao casal de pombinhos. Novamente aqui, o renitente vício do cinema brasileiro em associar o lesbianismo -- Tânia é a única que se assume -- a certa degradação moral e existencial.
Curioso vermos surgir do nada um grupo de terapia corporal, nos moldes reichianos, bailando em volta de Lena-Marcelo. A menina se empolga, dá alguns passos, e fala sobre estudos que comprovam a cura através da dança. O que pouca gente percebe é que no meio do grupo está a atriz Débora Bloch, então com 15 anos de idade, fazendo sua estréia no cinema.
O reaparecimento da mulher de Marcelo e o desfecho trágico respondem à pergunta óbvia: como um filme sobre tão pouco termina? Por sua falta de horizontes, "Fim de Festa" nos deixa a importante lição de que arte -- mesmo em um país subdesenvolvido -- pode ser apenas um exercício de contemplação. De se lamentar somente que Paulo Porto sobreviveu ainda vinte anos e nunca mais dirigiu, sendo este e o inesquecível "Em Família", exercícios de formalismo talentoso, que fariam diferença nas décadas seguintes.
3 comentários:
Pois é Andrea, vá entender porque Paulo Porto não fez mais filmes.
Gosto de todos os três que ele fez.
E Fim de Festa é mesmo a cara dos anos 70.
Bjs
Essas coisas, Adilson. O Paulo Porto acabou ficando à margem, saindo de cena. Pouco inclusive se comenta dele enquanto ator/produtor. Bjs
Queria tanto assistir a esse filme mas não sei onde encontrar
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