“Rio Babilônia” formou gerações e gerações de adolescentes em fúria, desde sua estréia em 1982. As reprises nas madrugadas de algumas redes de televisão eram comentadíssimas, e, nos tempos pré-internet, o tráfico de informações a seu respeito era intenso. As atrizes, as cenas de quase pornô, o sol, a cocaína, o suor e a cerveja estão impregnados no filme que, apesar de cortes sorrateiros – para adocicar o sexo explícito –, era assistido com louvor nas boas casas de família.
Chama a atenção, antes de mais nada, a escolha de Joel Barcellos para galã, atendendo pelo simpático nome de “Marciano”, profissional de uma agência de turismo, encarregado de assessorar os visitantes que chegam ao Rio. Um deles é o Dr. Liberato (Jardel Filho), recém-chegado ao Brasil após muitos anos no exterior. Christiane Torloni é Vera Moreira, a “intrépida repórter que desmascara poderosos” (sempre havia uma!) e investiga a denúncia de contrabando de ouro praticado pelas fazendas do Dr.Liberato. Este é o triângulo principal de Rio Babilônia, pelo menos no script, porque a ele se somarão dezenas de transeuntes, em poses espetaculares.
A primeira leva deles é vista numa festa celebrada pela cafetina do high-society, Solange (Norma Bengell). Ali estão políticos (Sergio Mamberti), senhores importantes e capangas de Liberato (um deles, Wilson Grey), antigo conhecido da anfitriã. Contrata-os para, claro, dar fim a Vera, que “excedeu-se” no trabalho detetivesco, contrário aos empreendimentos do escroque.
Jardel Filho, em seu último trabalho, nada lembra o tuberculoso de “Floradas na Serra” ou o poeta verborrágico de “Terra em Transe”. Em “Rio Babilônia” aparece de cuecas, calças pelos tornozelos, além de, próximo ao término do filme, protagonizar inacreditável cena de amor com um travesti – este, em nu frontal.
A presença do nu em filmes brasileiros não é de se estranhar. Existem muitas formas de tratá-lo e fazê-lo repleto de importância, em expressões artísticas, que, evidentemente, não se restringem ao cinema. O problema é que, ao mesmo tempo, o nu muitas vezes é a garantia de circo na vida do espectador. E latino-americanos são acostumados com tabus sobre a nudez masculina.
Pois em “Rio Babilônia” isto é esquecido. O exemplo mais célebre está no momento em que contracenam Denise Dummont, Pedrinho Aguinaga e Barcellos. Os zooms não deixam dúvidam de que tudo foi levado, digamos, bastante a sério. Confesso que temi pela integridade de Rocky – cãozinho da mansão de Dummont e Aguinaga –, cogitando de o diretor, Neville d’Almeida, levar a ação até as últimas conseqüências.
Neville – pitorescamente grifado “Nevile” ou “Neville”, “de” ou “D’Almeida” nos créditos desatentos que abrem o filme que dirigiu, escreveu e produziu – é antigo conhecido de produções com forte apelo erótico. “A Dama do Lotação’ e “Os Sete Gatinhos”, por exemplo, tornaram-se clássicos, além de ajudarem a popularizar uma pequena parcela da obra de Nelson Rodrigues. “Rio-Babilônia” tem roteiro co-assinado por Ezequiel Neves – co-fundador da revista “Rolling Stone” brasileira – e João Carlos Rodrigues.
Dona Zica, viúva de Cartola, faz uma pequena participação como a mãe do traficante Sabará, a quem recorre Barcellos para comprar mil dólares em cocaína – vulgo “brilho” ou “realce” – pedidos pela atriz internacional que se engraçara com o sambista (Antônio Pitanga), no mar de Copacabana. Vemos também o ex-dançarino dos “Dzi Croquetes”, Paulette; o vocalista da Blitz, Evandro Mesquita; o lendário Maurício do Vale; a promoter Liége Monteiro.
O que me deixou um pouco surpresa foi a escolha de um final retumbante, exacerbado, em que a música de fundo destoa da narrativa. Há uma pretensão tola de atribuir a “Rio Babilônia” a qualidade de magnus opus, de concerto no Convent Garden, quando na verdade ele é feito de incursões a favelas, gringos otários, prostitutas, passistas de escola de samba que transam na praia. Destoa e contradiz o filme.
Argumentos cínicos não colam: o filme é esfuziante do jeito que é, bem-humorado e elétrico, conforme indica-se no título. Aliás, sempre bom relembrar o campy “Babilônia Rock”: “Você vai cair de boca, enlouquecer, você tá marcando touca, vem me conhecer... Rio Babilônia, uou uou uou”.
A badalação nas festas de “Rio Babilônia” é intensa; trocas de olhares breves, consumações longas. Favelas, lixo, city-tour e algo próximo de uma crítica social. “Ninguém segura a juventude do Brasil” era slogan cantado por Don e Ravel, durante o regime militar. Passados alguns anos, ela estava turbinada, em sonhos megalomaníacos, consumindo doses e doses de uísque e pó, no satirismo próprio de uma cidade e de um cinema que não se levavam a sério e, que por isso mesmo, seduziam e encantavam tanto.
Chama a atenção, antes de mais nada, a escolha de Joel Barcellos para galã, atendendo pelo simpático nome de “Marciano”, profissional de uma agência de turismo, encarregado de assessorar os visitantes que chegam ao Rio. Um deles é o Dr. Liberato (Jardel Filho), recém-chegado ao Brasil após muitos anos no exterior. Christiane Torloni é Vera Moreira, a “intrépida repórter que desmascara poderosos” (sempre havia uma!) e investiga a denúncia de contrabando de ouro praticado pelas fazendas do Dr.Liberato. Este é o triângulo principal de Rio Babilônia, pelo menos no script, porque a ele se somarão dezenas de transeuntes, em poses espetaculares.
A primeira leva deles é vista numa festa celebrada pela cafetina do high-society, Solange (Norma Bengell). Ali estão políticos (Sergio Mamberti), senhores importantes e capangas de Liberato (um deles, Wilson Grey), antigo conhecido da anfitriã. Contrata-os para, claro, dar fim a Vera, que “excedeu-se” no trabalho detetivesco, contrário aos empreendimentos do escroque.
Jardel Filho, em seu último trabalho, nada lembra o tuberculoso de “Floradas na Serra” ou o poeta verborrágico de “Terra em Transe”. Em “Rio Babilônia” aparece de cuecas, calças pelos tornozelos, além de, próximo ao término do filme, protagonizar inacreditável cena de amor com um travesti – este, em nu frontal.
A presença do nu em filmes brasileiros não é de se estranhar. Existem muitas formas de tratá-lo e fazê-lo repleto de importância, em expressões artísticas, que, evidentemente, não se restringem ao cinema. O problema é que, ao mesmo tempo, o nu muitas vezes é a garantia de circo na vida do espectador. E latino-americanos são acostumados com tabus sobre a nudez masculina.
Pois em “Rio Babilônia” isto é esquecido. O exemplo mais célebre está no momento em que contracenam Denise Dummont, Pedrinho Aguinaga e Barcellos. Os zooms não deixam dúvidam de que tudo foi levado, digamos, bastante a sério. Confesso que temi pela integridade de Rocky – cãozinho da mansão de Dummont e Aguinaga –, cogitando de o diretor, Neville d’Almeida, levar a ação até as últimas conseqüências.
Neville – pitorescamente grifado “Nevile” ou “Neville”, “de” ou “D’Almeida” nos créditos desatentos que abrem o filme que dirigiu, escreveu e produziu – é antigo conhecido de produções com forte apelo erótico. “A Dama do Lotação’ e “Os Sete Gatinhos”, por exemplo, tornaram-se clássicos, além de ajudarem a popularizar uma pequena parcela da obra de Nelson Rodrigues. “Rio-Babilônia” tem roteiro co-assinado por Ezequiel Neves – co-fundador da revista “Rolling Stone” brasileira – e João Carlos Rodrigues.
Dona Zica, viúva de Cartola, faz uma pequena participação como a mãe do traficante Sabará, a quem recorre Barcellos para comprar mil dólares em cocaína – vulgo “brilho” ou “realce” – pedidos pela atriz internacional que se engraçara com o sambista (Antônio Pitanga), no mar de Copacabana. Vemos também o ex-dançarino dos “Dzi Croquetes”, Paulette; o vocalista da Blitz, Evandro Mesquita; o lendário Maurício do Vale; a promoter Liége Monteiro.
O que me deixou um pouco surpresa foi a escolha de um final retumbante, exacerbado, em que a música de fundo destoa da narrativa. Há uma pretensão tola de atribuir a “Rio Babilônia” a qualidade de magnus opus, de concerto no Convent Garden, quando na verdade ele é feito de incursões a favelas, gringos otários, prostitutas, passistas de escola de samba que transam na praia. Destoa e contradiz o filme.
Argumentos cínicos não colam: o filme é esfuziante do jeito que é, bem-humorado e elétrico, conforme indica-se no título. Aliás, sempre bom relembrar o campy “Babilônia Rock”: “Você vai cair de boca, enlouquecer, você tá marcando touca, vem me conhecer... Rio Babilônia, uou uou uou”.
A badalação nas festas de “Rio Babilônia” é intensa; trocas de olhares breves, consumações longas. Favelas, lixo, city-tour e algo próximo de uma crítica social. “Ninguém segura a juventude do Brasil” era slogan cantado por Don e Ravel, durante o regime militar. Passados alguns anos, ela estava turbinada, em sonhos megalomaníacos, consumindo doses e doses de uísque e pó, no satirismo próprio de uma cidade e de um cinema que não se levavam a sério e, que por isso mesmo, seduziam e encantavam tanto.
23 comentários:
Um 3x4 do Rio no princípio dos anos 80 e uma latente subcultura da cocaina em franca emergência. Meu imaginário interiorano-paulista-adolescente foi moldado, à època, por algumas das cenas de 'Rio Babilonia'; claro que eram cenas de nítido apelo sexual. Em suma, para mim, após o filme, o Rio se mostrava como uma putaria só (e ainda por cima a presença do fantasma do Pedrinho Aguinaga para seduzir nossas namoradas caipiras)
walner, muita boa essa história rsrs bem, para quem era do Rio como eu, parecia q o mundo inteiro era uma tremenda putaria rs Sempre achei estranha a participação do Joel Barcellos como galã, ainda por cima tendo o Aguinaga no filme :)
Joel Barcellos e Jardel Filho.
Andrea,
Execelente seu texto. Realmente este filme esteve no imaginário juvenil por muitos anos, não só pela caracterização quese idílica do Rio 80's, mas pelas mulheres e a forma que são mostradas;
- A liberdade de Cláudia (maravilhosa e branquíssima Denise Dummont)
- A destemida e quase-hippie jornalista Vera Moreira (Christiane Torloni - ainda hoje tão linda quanto em 82)
- A gringa maluquete e safadíssima Linda Lamar (Pat Cleveland)
- a festa com vários atores performáticos nus
- O leilão de mulheres no prostíbulo de Norma Bengel
Essa foi outra ilusão que ficou perdida quando a Aids chegou até nós...
Andrea,
Muito bom o seu texto-análise do filme, que não deixa de ser uma análise sobre um Rio de Janeiro/Brasil intenso que existe até hoje.
Cresci vendo as cenas de Rio Babilônia e como vcs, acreditando que tudo acabava em putaria! Não que hoje eu pense muito diferente disso, mas ao menos vejo o filme com outros olhos!
O gênero continua sendo indefinível, não é? Não sei se o sexo está em primeiro plano ou se o filme tem o sexo como moral... enfim, inesquecível! hehehe
Assisti umas 3 vezes o filme ,e o final é um dos mais polêmicos finais que já assisti.Tenho um blog sobre revistas em quadrinhos (desde nacionais e extrangeiras como zagor,conan,diabolik,spektro e etc)Algumas para download.Se quiserem visitar: http://editoralorentz.blogspot.com
Para que, como eu, é maluco pela música-título e pelo hedonismo do filme que ela mimetiza, aí vai o link para baixá-la.
http://rapidshare.de/files/20046010/ROBSON_JORGE_E_LINCOLN_OLIVETTI_-_RIO_BABIL_NIA.mp3.html
Balíssimo comentário.
O filme é de fato a cara do Rio, e de certa forma, do Brasil, de início dos anos 80.
Mas, afinal, onde encontrar esse filme para baixar ou para locação? Não tenho assinatura do Canal Brasil.
Andrea,
Muito bom o seu texto vou colocar um link no meu blog para esta resenha.
O filme é...assim... sei lá o que
porra louca total entende?
pois é... é isso ai.
Gostei de seu comentário. Viví essa época, "RB" é marcante, influenciou gerações, é registro real do que era, e ainda é, o cotidiano de nossas metrópoles. "RB" sempre será um marco positivo do cinema. ... e Denise Dumont, ah bela Denise, é uma das minhas três atrizes mais completas e preferidas. Quem ainda não assistiu Rio Babilônia tem de faze-lo e já! - eeds2@hotmail.com
Sou o própio Joel Barcellos, sou um ator formado nos palcos teatrais do teatro de Arena de SãoPaulo, e ser galã, nunca me passou pela cabeça, apenas um cronista social dessa Sensual cidade do Rio de Janeiro inigualavel no mundo, se alguem viu todos os meus filmes poderia me ver como galã em "Memórias de Helena" do Davi Neves,ou "Despedida de solteiro" de Haroldo Marinho Barbosa...não entrarei jamais em defesa do filme pois seria ridículo! Mas resumindo vejo com cero orgulho um trabalho realizado a quase 30 anos ainda ser discutido, cordiais saudações, JB
Joel, que prazer ver você aqui. "Memórias de Helena" é um dos filmes mais importantes na minha formação. Revi uma vez no Odeon, em uma sessão linda, com a pompa que ele merece. Aliás, você e o irmão do David estavam presentes. Nem sem preocupe com a defesa do "Rio Babilônia" rs Ele tem o mérito de falar de um determinado período, rindo de si mesmo e deixando um climão campy que aumentou com o tempo. Abraços
ícone contaminação derrubada resistências banimento preparou técnico sexualizada máscaras gurú
esse é um classico que assiti na tve até hoje me lembro com saudade! e nunca mais me esqueci da beleza de Cristiane Torloni ainda hoje um mulherão!!o filme é sensacional em sua forma de contar a crueza desse Rio de tanta liberdade,drogas orgias e vida desenfreada!uma verdadeira BabilÔnia de prazeres!!Marcos Punch.
O melhor do filme é a trilha de Robson Jorge & Lincoln Olivetti, que, aliás, devia ter sido lançada. Alguns temas do filme foram para o disco que a dupla lançou pela Som Livre no mesmo ano do lançamento de "Rio Babilônia". Robson & Lincoln traduziram musicalmente o Rio de Janeiro dos primeiros anos dos 80.
Beleza é um conceito relativo,mas sempre me incomodou ver joel barcellos como galã em filmes como esse e luz del fuego por ex,com todo respeito ao seu grande talento,e sua facilidade em ter ereção em cena.
Pô, Joel...aproveita que você tá aí e diz pra gente: entrou ou nao entrou?
Nossa!!vi este filme há uns 20 anos e gostaria muito de reve-lo,é um clássico do nosso cinema,pena que no Canal Brasil acho que nunca passou,,,,,
Só hoje que soube do falecimento do Joel Barcelos, em 2012.
Como ele não respondeu à pergunta acho que eternamente não saberemos se entrou ou não, como pergunta o Anônimo...
Pra mim entrou!
Só Denise Dumont pode responder...
Lembranças tirei do fundo do baú ganhei uma camiseta preta amei tinha 16 anos fui ver o filme tudo a ver com a época 40 anos atrás
Não sabia da morte de Joel Barcelos.
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